sábado, 19 de fevereiro de 2011

O JOGO E O BRINCAR




Ana Carolina Dias Tonussi e Rafael Bianchi Silva


O jogo e o brincar: o olhar e a prática dos professores de uma instituição de educação
infantil


[...]O brincar sempre foi e sempre será uma atividade espontânea e muito prazerosa,
acessível a todo ser humano de qualquer faixa etária, classe social ou condição econômica.
Mas o que diferencia o ato de brincar do ato de jogar? Após a leitura de Kishimoto (2005)
e Queiroz (2006) pode-se refletir que jogar é uma atividade atribuída de regras. É possível
utilizar o mesmo objeto para diferentes tipos de jogo (apenas com mudanças de regras), já
o brincar é uma atividade sem regras previamente estabelecidas onde a crianças manuseia o
brinquedo a partir de sua imaginação.
O RCNEI (BRASIL, 1998) diz que com o brincar as crianças criam e vivenciam situações
onde elas podem achar soluções às circunstâncias, o modo coerente para resolver os
problemas que encontram, assim como também, em frente a essas situações-problemas
podem construir compreensões particulares sobre as pessoas e os sentimentos a estas
relacionados.
Ainda com a leitura do RCNEI (BRASIL, 1998) verifica-se que o espaço adequado para
esse ato de brincar é algo importante, pois do que adianta ter boas atividades, mas um
espaço não apropriado? Assim como o docente de artes diz que sua sala de aula deve ter
materiais acessíveis aos alunos, um ambiente de brincar deve também o ser, podendo ter
fantasias, brinquedos, casinhas, amplo espaço para poderem brincar sozinhos ou em grupo,
etc., favorecendo o desenvolvimento da autonomia, liberdade e seu direito de escolha.
Dando continuidade ao RCNEI (1998) nesse processo referente ao brincar, o papel do
adulto é representado pelo professor, ou seja, aquele que inicia as brincadeiras podendo
oferecer aos alunos recursos diversos para essa atividade, tais como fantasias, brinquedos.
No que diz respeito aos jogos, o professor é aquele que impõe limites, que diz o ambiente
e o tempo para os alunos brincarem. Mas como sabemos, o brincar é uma atitude de que
um adulto não pode interferir, no sentido de escolher a maneira de como se brincar. O
mesmo pode participar, mas sob tutela da ação da criança. Ele também é um facilitador de
materiais para esse ato como uma atividade em que as crianças estão brincando de casinha.
O educador pode oferecer as crianças roupas e brinquedos que tenham forma de objeto
de casa como um fogãozinho, por exemplo. O papel do educador durante essa atividade
ao mesmo tempo é o de observador analisando o desenvolvimento da criança, registrando
seus avanços, as resoluções que propõe para os amigos perante os problemas vividos, sua
oralidade suas capacidades sociais e emocionais.
Um ponto importante sobre o brincar é que ele pode trazer sentimentos como a alegria e o
prazer. Vigotsky (1998 p.121) diz que:


Definir o brinquedo como uma atitude que dá prazer à criança é incorreto por duas razões.
Primeiro muitas atividades dão as crianças experiência de prazer muito mais intensas do
que o brinquedo, como por exemplo,chupar chupeta, mesmo que a criança não se sacie. E o
segundo, existem jogos nas quais a própria atividade não é agradável, como, por exemplo,
predominantemente no fim da atividade pré escolar,jogos só dão prazer a criança se ela
considera o resultado interessante .


Nesse trecho do texto, o autor relata que o brinquedo dá prazer às crianças, mas não o


tempo todo. Existem jogos que só dão prazer se o resultado for o que as crianças estiverem
esperando, como por exemplo, se em um jogo de futebol o time de um aluno perde, ele não
gostará do jogo, pois o resultado atingido não era o esperado.
Ainda seguindo Vigotsky (apud ZANLUNCHI, 2000 p.80), “[...] a criança desenvolve-se,
essencialmente, através da atividade do brinquedo [...]”. Por meio dessa passagem,
podemos compreender que o brinquedo é importante no desenvolvimento do aluno, não é
meramente uma atividade sem nenhum fim. Zanluchi (2000, p.80) diz que “assim como a
personalidade dos adultos se desenvolve através de suas experiências de vida, assim a das
crianças desenvolvi por intermédio da sua própria brincadeira”.
O mesmo autor (2000, p.115) diz que o trabalho é a fonte da criatividade, sendo que “[...] o
jogo é o trabalho da criança” [...] e também que “[...] a atividade lúdica está para a criança
assim como o trabalho está para o adulto [...]”. Com isso defende que a atividade lúdica é
necessária a fundamental para o desenvolvimento da criança para além de suas capacidades
atuais. Respeita-se também as características específicas da criança em relação ao adulto,
com formas e meios próprios para o desenvolvimento de suas potencialidades.
Agora falaremos superficialmente sobre o desenvolvimento do brinquedo enquanto objeto
próprio para o ato de brincar. Segundo Volpato (2010, p.2), o brinquedo era compartilhado
na origem, pois “havia certa margem de ambigüidade em torno dos brinquedos,
principalmente na sua origem. A maioria deles era compartilhada tanto por adultos quanto
por crianças, tanto por meninos quanto por meninas, nas mais diversas situações do
cotidiano”. Isso é bem interessante, pois adultos e crianças brincavam juntos, indiferente do
sexo, não havendo também separação dos brinquedos a partir da diferença de gênero (o que
é “de menina” e o que é “de menino”).
Wajskop (1995, p.63) também afirma que “na antiguidade, as crianças participavam, tanto
quando os adultos, das mesmas festas, dos mesmos ritos e mesmas brincadeiras”, hoje um
ato visto com não tanta freqüência, pois os adultos não brincam como o relato das autoras.
Eles detêm um papel na sociedade na qual são vistos como pessoas que trabalham e não
possuem tempo para brincar.
O mesmo autor também relata que antes os brinquedos eram feitos por aqueles que
respectivamente mexiam com o seu material de fabricação, como exemplo o soldadinho de
chumbo era feito pelo caldeiro, sendo, portanto, uma forma artesanal de fabricação. Vemos
atualmente uma mudança de perspectiva:


Essa forma de produção começou a desaparecer, principalmente com o inicio
da especialização dos brinquedos, que passou a ocorrer no século XVIII. Com o
desenvolvimento do capitalismo, o brinquedo passou a ser comercializado com fins
lucrativos. A partir daí, os objetivos do brinquedo começam a se afastar da sua origem
(VOLPATO, 2010, p.3).


Isso é visível. Hoje os produtores de brinquedo parecem não estar interessados em saber
para que servem o brinquedo. A maioria das empresas simplesmente o fazem em grande
escala afim de um retorno financeiro rápido e sem compromisso pedagógico em relação ao
objeto fabricado e ao desenvolvimento da criança. Segundo Volpato (2010,p.3), hoje,


Muitos dos brinquedos são fabricados para "ensinar" comportamentos, gestos, atitudes,
valores, considerados "corretos" em nossa sociedade. Por isso, a maioria deles já
vem pronta, catalogada, contendo todas as instruções de uso, idade, sexo, número de
participantes, tempo de duração do jogo, basta segui-las.


Com freqüência isso acontece. As crianças não sabem como estão sendo induzidas a certos
valores, comportamentos através do brinquedo, pois ainda não tem essa consciência, esses
valores têm que ser transmitidos pelos seus pais, responsáveis. Daí deriva a importância
de construir uma leitura ética do ato de brincar: não somos objetos para sermos também
produzidos em larga escala.


Após fazer uma breve descrição da importância do brincar no desenvolvimento humano,
passemos para o ato de jogar. Segundo Kishimoto (2006), desde sempre o jogo fez parte da
vida do homem. Mas o que é “jogo”? “Jogos” são atividades atribuídas de regras, podendo
manter o objeto da ação, mas modificando as regras.
Já segundo Huizinga (apud FORTUNA, 2000, p.1), o jogo segue essa característica:


Uma atividade voluntária, exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e
espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatória dotada de
um fim em si mesma, acompanhada de um sentimento de tensão e de alegria e de uma
consciência de ser diferente da vida cotidiana.


Com essa citação acima podermos ver que o jogo é uma atividade voluntária, mas que
segue certos padrões de tempo e espaço com regras que já são previamente estabelecidas.
Há também o envolvimento de sentimentos como a tensão. Essa emoção pode ser sentida
quando um jogo está prestes a terminar para saber quem será o ganhador e alegria quando
se ganha o jogo e por fim pode ser uma atividade diferente da realidade que as crianças
vivem.
Piaget (1998, p.158) comenta que “o jogo é um caso típico das condutas negligenciadas
pela escola tradicional, dado pelo fato de parecerem destituída de significado funcional”.
Isso demonstra que as escolas tradicionais não dão tanta importância aos jogos, pois acham
que suas instituições aprovando o ato de jogar não são serias.
Agora será relatado um pouco sobre os benefícios os jogos em grupo. Segundo Riccetti
(2001, p.19), “os jogos em grupo existem há muito tempo, mas o valor educacional
atribuídos a eles era muito mais limitado do que podemos ver numa perspectiva piagetiana,
no qual os jogos em grupo estimulam o desenvolvimento da criança”. Continuando, o autor
afirma que para um bom jogo ocorrer, portanto, deve ter as seguintes características: “ser
diferente e desafiador, permitir que a própria criança avalie seu desenvolvimento e
propiciar a participação ativa de todos os jogadores durante todo o jogo” (p.20).
Em relação ao jogo, Piaget (1998, p.158) diz: “a criança que joga desenvolve suas
percepções, sua inteligência, suas tendências à experimentação, seus instintos sociais, etc”.
Ainda relata que :


É pelo fato do jogo ser um meio tão poderoso para a aprendizagem das crianças, que em
todo lugar onde se consegue transformar em jogo a iniciação à leitura, ao cálculo, ou à
ortografia, observa-se que as crianças se apaixonam por essas ocupações comumente tidas
como maçantes (PIAGET, 1998, p.158-159).


O autor não está defendendo, com essa pontuação, a didatização do jogo, mas sim que com
o auxilio do jogo se pode tornar o aprendizado desses conteúdos mais prazerosos. Como
aponta Piaget, os elementos trabalhados na escola podem ser considerados habitualmente
pelos alunos como “chatos” e com esses recursos, as crianças poderiam mudar seus olhares
sobre os mesmos.


Riccetti (2001), em suas pesquisas sobre o valor dos jogos em grupo, encontrou estudos de


Piaget sobre quatro estágios na maneira como as crianças brincam que são:
a)Jogo motor e individual: Nessa fase a criança brinca sozinha, seus atos não são
considerados jogos, pois são variados,na idade de 3 anos não sentem a necessidade de
regras.
b)Jogos egocêntricos (2 a 5 Anos): Nesse período imitam colegas mais anda brincam
sozinhas,acham mais interessantes o que elas fazem.
c)Cooperação incipiente (Entre 7 e 8 anos): Todos o jogadores tentam vencer,surge a
competição e jogadores chegam a um acordo de como são as regras do jogo.
d)Codificação de regras (entre 11 e 12 anos): Nessa fase a habilidade aumenta de jogar o
jogo.
Riccetti diz (2001, p.21) “o objetivo do uso de jogos de grupo é estimular o
desenvolvimento da autonomia não ensinar as crianças a jogar”. Afirma que o jogo com
regras as crianças desenvolvem moralmente, socialmente, cognitivamente, politicamente
e socialmente. Menciona o papel do professor como sendo fundamental e ainda diz que
o valor do jogo depende de como o professor media enquanto a criança joga. Na escola,
segundo o autor, o jogo tem sua importância “[...], pois por intermédio do jogo aprendem
mais do que por meio da atividade em folinhas xerocadas [...]” (p.22).
Como mencionado, no ato do brincar o educador tem um posicionamento no qual deve
intervir para facilitar as atividades dos alunos e quando eles já sabem, pode acompanhar
as ações atuando da forma já indicada anteriormente (registro, acompanhamento do
desenvolvimento, inserção de novas propostas de jogo mais complexas que as atuais,
etc). Para estimular o pensamento da criança, pode-se fazer perguntas durante a ação do
jogar. Também deve-se observar se o jogo despertou interesse nas crianças, se as manteve
mentalmente presa e nunca se pode obrigar uma criança a jogar (pois assim a atividade
pode acabar perdendo o seu valor) [...]


Bibliografia


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. RCNEI – Referencial Curricular Nacional da Educação Infantil – Brasil, 1998. p.22 a 23,27 a 30 e 49.
CENTRO DE EDUCAÇÂO INFANTL. Projeto político pedagógico. Londrina. 2009. P.22-25.
FORTUNA, T. R. Sala de aula é lugar de brincar? Disponível em http://www.pead.faced.ufrgs.br/sites/publico/eixo3/ludicidade/valeria/
texto_sala_de_aula.pdf. Acessado em 10/10/2009.
KISHIMOTO, Tizuko Morchida. O jogo e a educação infantil. Jogos, brinquedos e brincadeiras e a educação infantil. 8. ed. São Paulo. Editora
Cortez. 2005. p. 13- 23.
PIAGET, Jean. Princípios de educação e dados psicológicos. In: ______. Psicologia e pedagogia. 9. ed. Rio de Janeiro. Editora Forense
universitária. 1998. p.158-160.
QUEIROZ, Alda Ramos de. Jogos como meio de aprendizagem, aprender brincando. 2006. Trabalho de conclusão de curso (Graduação em
pedagogia) - Faculdade Norte Paranaense - Uninorte. Londrina.
RICCETTI, Vanessa Pugliese. Jogos em Grupo para Educação Infantil. Educação Matemática em Revista. Nº11. Ano 8. Dez/2001. p.18-25.
Disponível em http://matematicanreapucarana.pbworks.com/f/Texto+6+Jogos+em+grupo.pdf Acesso em 13/02/2010.
VIGOTSKY, L.S. O papel do brinquedo no desenvolvimento. In______ A formação social da mente 6. ed.São Paulo: Martins Fontes, 1998. .
p.121- 137
VOLPADO, Gildo. Jogo e brinquedo: Reflexão a partir da teoria crítica. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-
73302002008100011&script=sci_arttext . Acesso em 13/10/2010.
WAJSKOP, Gisela. O brincar na educação infantil. Caderno de pesquisa, São Paulo, n.92, Fev.1995. p.62 – 69. Disponível em http://
www.fcc.org.br/pesquisa/publicacoes/cp/arquivos/742.pdf. Acesso em 24/01/2010.
ZANLUCHI, Fernando Barroso. O criar e o Brincar. Londrina: O autor, 2005.


Publicado em 12/01/2011 11:12:00


Currículo(s) do(s) autor(es)


Ana Carolina Dias Tonussi e Rafael Bianchi Silva - (clique no nome para enviar um e-mail
ao autor) - Ana Carolina Dias Tonussi: Graduanda de Pedagogia pela Faculdade Norte
Paranaense – Uninorte.
Rafael Bianchi Silva: Psicólogo, doutorando em Educação (UNESP/Marília), mestre em


Educação (UEL). Atualmente é docente da Faculdade Norte Paranaense e da Faculdade
Pitágoras. Email: tibx211@yahoo.com.br


Bibliografia


TONUSSI, A . C. D.; SILVA, R. B. O Jogo e o brincar. Disponível em http://
www.psicopedagogia.com.br/new1_artigo.asp?entrID=1323. Acesso em 24 jan 2011.

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